Espetáculo multimédia “A Secreta Vida das Palavras”

Bilheteira
 

18h00 | Auditório Municipal Ruy De Carvalho, Oeiras

Espetáculo Multimédia com Hélder Moutinho, Jonas, José Anjos, Marta Ren (compositores) Fernando Pinto do Amaral, Nuno Miguel Guedes, Tiago Torres da Silva (escritores) Rafael Balão (apresentador)

Este espetáculo multimédia dá corpo ao tema “A Palavra na Rua”, revelando a articulação entre fotografia, literatura e música. Nove imagens selecionadas inspiram textos originais, que se transformam em novas obras musicais, apresentadas em estreia absoluta.

 

Fotografias

 

Textos e Poemas

  • CASINO

    Não temos dinheiro
    Só temos cansaço
    Corre o dia inteiro
    Sem tempo nem espaço

    É só ruído mudo
    Ruído digital
    Precisamos de tudo
    Direito universal

    Estamos todos sempre à venda
    Não dá pra fazer desconto
    Temos de pagar a renda
    É no dia oito em ponto

    E se o mundo é um casino
    Vamos ter de entrar no jogo
    Até fazemos o pino
    Se o pagamento for logo

    Desfilamos em protestos
    e em manifestações
    Assinamos manifestos
    e fazemos petições
    Vamos ficar com os restos
    dos vossos muitos milhões 

    REFRÃO

    Não temos casa
    Não temos tecto
    Tudo isto arrasa
    O intelecto

  • ESTA CIDADE

    O cinzento que o beija
    Como se essa tristeza
    Fosse um bem que se deseja

    O que me acolhe é o frio
    Que a porta torna em calor
    Confunde-se com amor

    Mas sempre, sempre sobeja

    [refrão]

    Leva este olhar, esta lente
    Dolente
    Doente de te amar

    A vida é escassa
    E passa
    Sem nunca ver o mar

    v.2

    O que me interessa é a ponte

    Essa possibilidade
    De haver boa vontade
    Sem poder olhar a margens

    O que me salva é a fonte
    Escondida na cidade
    Uma branca realidade
    Rara nestas paragens

    [refrão]

    Leva este olhar, esta lente
    Dolente
    Doente de te amar

    A vida é escassa
    E passa
    Sem nunca ver o mar

  • O QUE VALE

    Gritam-me dos muros
    Gritam-me do silêncio
    Que somos um absurdo
    Que todos os sonhos que urdo
    Irão deixar de ter estrada

    Apagam-se os futuros
    Riscados em todo o lado
    Abandona-se a verdade
    Por uma negra cidade
    Porque a vida não vale nada

    Não olhes para essa luz
    Não vás por esse caminho:
    Há gente, rosto e vontade
    Há luta, amor e verdade
    Que nos salvam do que é mudo

    Por isso caminha comigo
    Faz comigo os dias claros
    Encontremos essa morada
    Se a vida não vale nada
    Somos nós que valemos tudo.

  • v.1

    Vejo que paras

    Reparas
    Disparas à queima-pele
    Um grito com voz de mel
    Mas que sabe a desespero

    E então amparas

    E saras
    As feridas cor de chão
    Onde esteve o coração
    Com amor que já não espero

    [refrão]

    E gritas
    Ao ouvir o mundo triste
    Por saber tudo o que existe
    E não vais poder salvar

    Só te resta disparar

    v.2

    Ao perto o mundo

    Imundo
    Que nos fere e envelhece
    Que avança e apodrece
    Num lugar que acabou

    É luta inútil
    E fútil
    Resistir ao que sabemos

    Que nasceu quando nascemos
    E te torna no que sou

    [refrão]

    E gritas
    A ouvir o mundo triste
    Por saber tudo o que existe
    E não vais poder salvar

    Só te resta disparar

    v.3

    Mas essa bala
    Salvá-la
    Apesar de ilusão
    Vai estar nessa tua mão
    Carregada de vontade

    Talvez com sorte
    Com norte
    Apontes ao lugar certo
    E de coração aberto
    Acertes na Humanidade

    [refrão]

    E gritas
    A ouvir o mundo triste
    Por saber tudo o que existe
    E não vais poder salvar

    Só te resta disparar

  • CAIS (CANÇÃO DO SUICIDA)

    I

    Quando vês este rio tens saudades
    de um futuro secreto e só teu
    a crescer sem razão nem idade
    como um livro que ninguém escreveu

    Era assim que a paisagem te via
    com um olhar feito de água a correr
    nesse tempo em que a tua alegria
    não sonhava que ia morrer

    Para lá deste céu aparece
    outra vida que também foi tua
    outro mundo que ainda tivesse
    o sabor da memória mais nua

    REFRÃO

    Vai-te embora, vá lá,
    Esse rio é pra ti
    Já não queres estar cá
    Já não estás bem aqui

    II

    Mas hoje tudo vês assim mudado
    em cores que não conheces nem dominas
    e tão incerto te achas do teu estado
    à espera de outros rumos, outras sinas

    Aqui tudo o que abraças é um rio
    a quem confessas febres e descrenças
    num cais donde a tua alma já partiu
    mesmo que do contrário te convenças

    E agora já não sabes quem te fala
    mas sentes qual será o teu caminho
    talvez só um mergulho ou uma bala
    ciente de que não irás sozinho

  • ZERO EM COMPORTAMENTO

    Se não tenho dinheiro, passo fome
    Se não tenho um telhado, tenho a rua
    Se não tenho um futuro, dou-lhe um nome
    E quando o chamo a vida continua

    Se não tenho uma vida, tenho um sonho
    Regado com cerveja e com bom vinho
    Mas nunca o medo em mim é tão medonho
    Que me faça esquecer do meu caminho

    Dos mais velhos não aceito
    Nem sermões nem julgamento
    Os exemplos que eu respeito
    São do mar e são do vento

    E por isso no meu peito
    Só faz falta este talento
    De saber que é meu direito
    Ter zero em comportamento

    Se toda a gente fala do que eu quero
    Ou que devia q’rer desde menino
    Eu nunca quis mais nada que ser zero
    Deixem-me em paz entregue ao meu destino

    Mas não lamento aquilo que não fiz
    E não me vergo à força do chicote
    Talvez seja possível ser feliz
    Sem enfrentar moinhos, à Quixote

    Dos mais velhos não aceito
    Nem sermões nem julgamento
    Os exemplos que eu respeito
    São do mar e são do vento

    E por isso no meu peito
    Só faz falta este talento
    De saber que é meu direito
    Ter zero em comportamento

    Zero ambições, ser uma nulidade
    Zero em ciências, zero em português
    Até me dá uma certa vaidade
    De ser um zero perto de vocês

    Quem traz a solidão da meninice
    Dá o melhor que tem sempre que sente
    Não lhe faz mossa o disse ou o não disse
    Se sabe que ser nada é que é ser gente

    Dos mais velhos não aceito
    Nem sermões nem julgamento
    Os exemplos que eu respeito
    São do mar e são do vento

    E por isso no meu peito
    Só faz falta este talento
    De saber que é meu direito
    Ter zero em comportamento

  • A VIDA A ACONTECER

    O claro-escuro, a paisagem
    A sombra que rasa o muro
    Onde termina a viagem
    De quem leva na bagagem
    Um coração claro-escuro?

     Passa-se a vida a correr
    Sem notar que ali ao lado
    A vida a acontecer
    Pode passar a correr
    Sem mesmo a termos notado

    Quando uma vida começa
    Ninguém pode adivinhar
    Como ela passa depressa
    Por isso, quando começa
    Já está quase a terminar

    Viver nesse claro-escuro
    Num tempo que se faz raro
    É transformar o futuro
    De um claro que se faz escuro
    Num escuro que se faz claro

  • ELA POR ELA

    Ficar sempre aqui sozinha
    a ver a vida lá fora
    saber que não é só minha
    esta luz a ir-se embora

    Diante da rua triste
    entre as sombras de ninguém
    só vejo o que não existe
    o amor que já não vem

    Cada dia dura mais
    cada minuto uma hora
    Quem ouve agora os meus ais
    se em mim nada se demora?

    E assim me sento à janela
    sempre adiada a partida
    Tudo fica ela por ela
    já fiz as contas com a vida

  • NO OUTRO LADO DO MURO

    Era o braço que se erguia
    Era a boca que gritava
    Era o cravo que floria
    E o futuro começava

    Era  a lágrima contente
    Era o abraço apertado
    E um cravo na mão da gente
    A dizer muito obrigado

    No outro lado do muro
    Morava o sonho mais lindo
    De quem olha pró futuro
    E lhe diz: - sejas bem- vindo!

    E nunca como então
    As ruas foram nossas
    E lágrimas no chão
    Faziam poças

     

    E cada gargalhada
    Era a mais verdadeira
    Aquela madrugada
    Era a primeira

     

    Era um e eram dois
    Com os mesmos ideais
    Cinquenta anos depois
    Cada dia somos mais 

    E  ninguém estava sozinho
    Éramos irmãos da esp’rança
    Num país já tão velhinho
    Que voltava a ser criança

    Era um pedaço de gelo
    Finalmente derretido
    Era o fim de um pesadelo
    Que ninguém tinha pedido 

    E nunca como então
    As ruas foram nossas
    E lágrimas no chão
    Faziam poças

    E cada gargalhada
    Era a mais verdadeira
    Aquela madrugada
    Era a primeira

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